“Estátuas e cofres e paredes pintadas, ninguém sabe o que aconteceu...”, disse o profeta profano, ao sinalizar o descuido da humanidade para com os problemas reais da existência humana. A criança se jogou da janela, do 5º andar, porém, ninguém sabe o porquê. E por que não sabe? Por que ninguém entende? Ora, simplesmente pelo fato de os homens terem se trancafiados nos cofres de suas religiões mercantilistas, de terem eles pintado um mundo irreal, de ilusões, onde o orgânico se transformou em meras estórias de fantasias, que alimentam expectativas vãs e que não têm o poder de transformar corações. Os homens transformaram-se em estátuas de sal, sem sabor, sem utilidade, que não servem nem para a terra, nem para o monturo, senão para serem jogadas fora.
Os pintores do sagrado retrataram o Divino – Mistério que permeia o Cosmo – com as cores da objetividade pueril de suas teologias cegas, inorgânicas, sistemáticas. Não demorou, pois, para que tudo o mais se objetivasse, e se perdesse a sensibilidade da dor que dói, do sangue quente que esvai, da súplica que salta dos olhos vivos dos mortos, que perambulam pelo mundo, carentes de misericórdia, de compaixão, de salvação.
Mas os mestres da arte pictórica encadernaram o Verbo vivo, encadeando-O nas frias páginas de um livro de luxo, em cuja capa de couro fino se escreve, com letras douradas, SAGRADO. A Verdade foi transformada em fósseis, que satisfazem os corações de pedra e petrificam as consciências, transformando-as em estátuas, a fim de ornamentarem as “poesias concretas” das praças de um não-mundo criado pelos homens.
Ah, saudade dos verdadeiros poetas, dentre os quais, um deles, organicamente, disse:
“Mundo mundo vasto mundo,
Se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
Mais vasto é o meu coração”
Ora, como saber o que de fato está acontecendo, se não há solução, mas somente rima?
Ah, teólogos parnasianos, “sapos-boi”, “sapos-tanoeiros”, teólogos aguados. Voltai os vossos olhos às Escrituras e procurai nelas a Vida ali revelada. Permiti que aos vossos olhos salte a Palavra viva, eficaz, expressão exata da Realidade. Somente assim vereis que o inferno por vós anunciado já inflama suas chamas, destruindo vossas cidades de Sodoma e Gomorra, erigidas nos fulcros da ganância, do medo e da culpa. Vossa sorte encontra-se no fato de o vosso deus ser tão somente fruto de ignorância e engano. Pois se fosse como pensais, sua misericórdia há muito ter-se-ia acabado, e vós, destruídos.
A Essência jamais passará, embora, no atual momento, encontra-se oculta, como tesouro escondido nas ruinas dos corações engodados. Uma vez retirados os escombros do edifício teológico ocidental, ouvir-se-á novamente a voz dos profetas dizendo: “o amor não se ressente do mal... tudo sofre... tudo suporta... tudo espera... tudo crê... pois Deus é amor.
Mas quem ouvirá a voz do profeta profano, que ensina o belo refrão, no qual é afirmado ser “preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã”? Mais fácil é lançá-lo no inferno, uma vez que sua existência não se encaixou na matriz anticanônica das paredes pintadas pelos dramaturgos da religião.
No amor do Verdadeiro,
Alexandre Rodrigues
Obs.: No texto há expressões poéticas de Manoel Bandeira, Caetano, e um trecho da poesia de Carlos Drummond: POEMA DE SETE FACES.