ÁRVORE DO CONHECIMENTO DO BEM E DO MAL

Pergunta: Uma vez que a árvore do conhecimento do bem e do mal significa o momento transicional do homem, do estágio de inconsciência para o de consciência, por que Deus proíbe o homem de comê-la, se para isso e com tal capacidade fora criado? Resposta de Alexandre Rodrigues 1. A árvore do conhecimento, pela sua própria designação e natureza, indica a fronteira entre o conhecer e o não conhecer o bem e o mal. A submissão irrefletida aos paradigmas antigos levou os cristãos à incompreensão do texto mosaico acerca da referida árvore, fazendo-os vê-la como a causa primária do pecado. Não é, pois, sem razão, que o mundo judaico-cristão entende, até os dias de hoje, que a queda do homem resultou do fato de ele ter comido uma fruta, conforme reza a tradição. Porém, esse entendimento não responde aos problemas reais da humanidade, quando analisados do ponto de vista ontológico, pneuma-psicossomáticos. Pense comigo: se a árvore do conhecimento é a causa primária do pecado, não deveria ela estar presente também no mundo pré-adâmico, sendo semelhantemente a causa da queda de Lúcifer? Quando refletimos acerca desta árvore, logo se percebe a necessidade de transcendermos a figura para encontrar o seu significado. Vejamos aqui alguns pontos: 1.1. Antes de o Homem comer do fruto da árvore do conhecimento, é certo que ele não possuía o conhecimento do bem e do mal. Logo, ele não discernia a luz e as trevas, a vida e a morte. 1.2. Ora, não podendo o homem julgar entre o certo e o errado, o bem e o mal, a luz e as trevas, conclui-se, por força da verdade, que ele NÃO POSSUÍA LIVRE-ARBÍTRIO. Do contrário, como poderia o Homem exercer a livre escolha de algo que ele não discernia? 1.3. Em verdade, o livre-arbítrio floresce no Homem no exato momento em que ele transita do estado de inconsciência para o estado de consciência. No momento em que ele come do fruto, quando se torna conhecedor do bem e do mal, é que então pode decidir entre a luz e as trevas, o bem e o mal, a vida e a morte. Temos aqui, portanto, a primeira conclusão: Deus não proibiu o Homem de comer da árvore do conhecimento; antes, além de inevitável, era necessário que o homem comesse do seu fruto, não somente por causa da natureza humana, que é evolutiva, mas para que o propósito de Deus quanto ao Homem se cumprisse: atingir a estatura de varão perfeito. Afinal, como poderia Deus cumprir o seu plano, se o Homem se mantivesse eternamente no estágio pré-consciente? Entretanto, logo alguém interpelará dizendo: “Mas isso não condiz com o registro de Gênesis. Como compreender o relato da queda, conforme Moisés registrou no livro dos começos? Bem, para entendermos o assunto à luz da Verdade, é preciso fazermos um estudo crítico-analítico do texto em questão. Vejamos. 2. O verbo “comer”, em Hebraico (Gn 2:17), é ‘âkal, e passível de várias acepções. Dentre elas pode-se citar as seguintes em variados contextos   2.1. Comer (o ato de comer) como em Gn 9:4. 2.2. Consumir com o sentido de queimar, devorar (como em Is 10:17). 2.3. Angústia, ser tomado de… (como em 1Rs 22:27). 2.4. Comedor (aquele que se alimenta), como em Jz 14:14. 2.5. Comer com o sentido, não de um ato, mas de continuidade, como em 1Sm 1:8. 2.6. Devorador como em Ml 3:11. 2.7. Mantimento como em Lv 25:7. Bem… diante de tantas acepções, como compreender o que se diz em Gn 2:17? Para obtermos a exata aplicação da palavra hebraica, vamos recorrer a um texto do NT, com o fim de elucidar a questão. Em João 6:57, está escrito: “Assim como o Pai, QUE VIVE, me enviou, e igualmente eu VIVO pelo Pai, também quem de mim se ALIMENTA por mim VIVERÁ”. Nesse texto, vê-se claramente que Jesus não faz menção a um ato, concluído, de se comer dele. Mas, como bem indica a expressão – “quem de mim se alimenta” –, Jesus faz referência a um ato contínuo de se alimentar dele. Observe que Cristo, realidade da árvore da vida, fala da necessidade do Homem de se alimentar dele. Se transferirmos esse mesmo princípio para Gn 2:17, a partir das acepções da palavra hebraica usada para “comer”, entenderemos que Deus não proíbiu o Homem de comer do fruto da árvore do conhecimento, no sentido de 2.1. A proibitiva encontra-se na seguinte ideia, conforme a paráfrase do texto: “mas a árvore do conhecimento do bem e do mal não tomarás por mantimento” (2.7.); ou seja, o homem, ao tomar do fruto da árvore, isto é, ao transitar do período da inconsciência para o da consciência, não poderia viver por meio do conhecimento em detrimento à Vida de Deus n’ele (Cp. Jo 6:57). Quando a inteligência florescesse no Homem, este não deveria se tornar um “devorador” (2.6.) do conhecimento, como quem busca garantir a sua existência pela força do conhecimento; o Homem não deveria ser tomado (interiormente), como quem é tomado de angústia, pelo conhecimento (2.3.); o Homem não deveria ser consumido, devorado, ou queimar-se interiormente pelo conhecimento do bem e do mal, pois todos esses verbos implicam o nascimento do ego (2.2); o Homem não deveria tomar por alimento de sua existência o conhecimento (2.4). O Homem deveria viver de toda a palavra que procede da boca de Deus (Mt 4:4), buscando em primeiro lugar o reino de Deus e a sua justiça (Mt 6:33). A inteligência, interligare (lat.), cujo significado quer dizer “a capacidade de interligar os fatos, discernindo os nexos que há entre as coisas” (inter+ligare), deveria servir para o Homem conhecer a si mesmo e a Deus, desenvolvendo um relacionamento consciente com a Vida. Esta é razão por que repetidamente nos ensinam os apóstolos que a vida eterna consiste em conhecer a Deus (Jo 17:3). O contrário disso, todavia, foi o que aconteceu. Ao atingir o estágio de consciência, o Homem orgulhou-se do atributo da inteligência, privativo dos seres humanos. O resultado disso, já profetizado pelo SENHOR, foi a morte, como bem lhe havia dito: se permitires que o conhecimento do bem e do mal inflame o seu coração (2.2.), certamente morrerás. 3. O contraditório. Alguém poderá argumentar, dizendo: por que, então, Deus haveria de proibir o Homem, depois de caído, de comer da árvore da vida? (Gn 3:22). Ora, se esta é a vontade de Deus, que o Homem viva pela sua Vida, por que haveria de obstar o caminho da árvore da vida, impedindo-o de retomar o caminho da dependência do Criador? 4. A solução. Estamos aqui diante de mais um problema de versão das escrituras. Comparemos pelo menos duas versões: Na versão atualizada está escrito: “Então, disse o SENHOR Deus: Eis que o homem se tornou como um de nós, conhecedor do bem e do mal; assim, que não estenda a mão, e tome também da árvore da vida, e coma, e viva eternamente. O Senhor Deus, por isso, o lançou fora do jardim do Éden…” (Gn 3:22). Observe, atendo leitor, que há um ponto-final depois da palavra “eternamente”, fato este que deixa o texto sem sentido. Para que se observe claramente esse apontamento, vamos separar as orações do período: Primeira oração: “Eis que o homem se tornou como um de nós, conhecedor do bem e do mal” Segunda oração: “assim, que não estenda a mão” Terceira oração: “e tome também da árvore da vida” Quarta oração: “e coma” Quinta oração: “e viva eternamente” Observe que os verbos estenda, tome, coma e viva estão no modo subjuntivo. O que isso significa? Ora, o modo subjuntivo é empregado em orações subordinadas, o que implica que todas elas fazem parte da oração principal: “o Senhor, por isso, o lançou fora do jardim do Éden”; ou seja, as orações com verbo no conjuntivo completam o sentido desta última oração. Mas onde está o problema? Simples. Se as orações subordinadas completam o sentido da principal, não deveriam elas serem separadas pelo ponto-final. Estamos, pois, diante de uma versão com um problema extremamente grave, o que lhe tira toda a sua autoridade, nesse sentido que estamos falando. O ponto-final, separando orações subordinadas da principal, demonstra a fragilidade da versão e a desatenção do tradutor. Agora veja o mesmo texto na versão corrigida: “Então, disse o SENHOR Deus: Eis que o homem é como um de nós, sabendo o bem e o mal; ora, pois, para que não estenda a sua mão, e tome também da árvore da vida, e como, e viva eternamente, O SENHOR DEUS, POIS O LANÇOU FORA DO JARDIM DO ÉDEN…”. Veja bem, caro leitor, que a primeira oração foi dita por Deus “eis que o homem é como um de nós, sabendo o bem e o mal”; já a segunda oração, “ora, pois, para que não estenda a mão, e tome também da árvore da vida, o SENHOR, pois o lançou fora do jardim do Éden…”, esta foi dita por Moisés. Esta versão faz toda a diferença. NÃO FOI DEUS QUEM IMPEDIU O HOMEM DE COMER DA ÁRVORE DA VIDA. ESSA FOI A INTERPRETAÇÃO DE MOISÉS. Parece complicado tal afirmação, de que Moisés interpretava a seu modo os fatos. Mas, para perceber as incoerências da visão de Moisés em relação à verdade, basta comparar o registro da queda do Homem, na visão de Moisés e na visão de Cristo. Em Moisés, nos é dito que “Deus expulsou o Homem do jardim”; quando Cristo, entretanto, relata o mesmo episódio, a queda do Homem, na parábola do filho pródigo, ele afirma que o filho saiu de casa, ao passo que o seu pai ficou com os braços estendidos aguardando o seu retorno. Na visão de Cristo acerca da queda, não se vê um pai irado, expulsando o seu filho de casa. Vê-se exatamente o contrário. Ora, como conceber tamanho disparate? Somente quando se compreende que a “graça e a verdade vieram por meio de Jesus Cristo”, e que a Lei foi dada por intermédio Moisés (Jo 1:17), é que se pode entender a diferença de visão entre o Antigo e Novo Testamentos. Moisés não conhecia a Deus; foi o Deus unigênito que no-lo revelou (Jo 1:18), como também está escrito: “Também sabemos que o Filho de Deus é vindo e nos tem dado entendimento para conhecermos O VERDADEIRO” (1Jo 5:20). Outro exemplo, do modo como Moisés interpretava os fatos ao seu modo, é o caso da destruição de Sodoma e Gomorra, em Gn 19. Compare-o a um outro episódio semelhante, registrado em Lc 9:51-56: “E aconteceu que, ao se completarem os dias em que devia ele ser assunto ao céu, manifestou, no semblante, a intrépida resolução de ir para Jerusalém e enviou mensageiros que o antecedessem. Indo eles, entraram numa aldeia de samaritanos para lhe preparar pousada. Mas não o receberam, porque o aspecto dele era de quem, decisivamente, ia para Jerusalém. Vendo isto, os discípulos Tiago e João perguntaram: Senhor, queres que mandemos descer fogo do céu para os consumir? Jesus, porém, voltando-se os repreendeu e disse: Vós não sabeis de que espírito sois. Pois o Filho do Homem não veio para destruir as almas dos homens, mas para salvá-las”. A comparação entre o episódio da destruição de Sodoma e o episódio do evangelho, supracitado, não nos deixa dúvida de que Moisés compreendia os fatos com os olhos da Lei, e não segunda a Verdade, a qual nos foi trazida pelo Verbo de Deus. Ao registrar o fenômeno natural da destruição das cidades vulcânicas, Moisés o conferiu a Deus. Quando, entretanto, em situação semelhante, dois discípulos queriam pedir ao Pai para destruir uma aldeia de samaritanos, Jesus lhes respondeu: “VÓS NÃO SABEIS DE QUE ESPÍRITO SOIS”; ou seja, vocês não sabem por qual espírito estão sendo inspirados; certamente não o é pelo Espírito de Deus. Deus NÃO MANDA FOGO PARA CONSUMIR OS HOMENS; ele envia o seu Filho, não “para destruir as almas dos homens, mas para salvá-las”. Por esses e outros motivos, concluímos, segundo a versão Corrigida da bíblia sagrada, que não há – da parte de Deus – proibição de se comer da árvore da vida. A árvore da vida esteve tão acessível aos homens, por meio do Cordeiro de Deus, que foi morto antes da fundação do mundo, como esteve nos dias de sua encarnação e como está nos dias atuais: “Eu sou o pão da vida… quem come da minha carne e bebe do meu sangue tem a vida eterna… quem de mim se alimenta por mim viverá. Em Cristo, Alexandre Rodrigues

3 comentários

  1. Alexandre, graça e Paz! Como interpretar o versículo 24 do capítulo 3 de Gênesis? Pois é dito por Moisés que havendo lançado fora o homem, pôs querubins ao oriente do jardim do Éden, e uma espada inflamada que andava ao redor, para guardar o caminho da árvore da vida (ACF).

  2. Acredito que o impedimento de comer da arvore da vida(Cristo) ocorreu por principiar ali o desenvolvimento da inteligencia humana, visto que Moisés autor do escrito representa os rudimentos, posteriormente na plenitude dos tempos conforme o desenvolvimento da inteligencia humana tornou-se disponível a arvore da vida (Cristo).

  3. Bispo Alexandre, graça e paz!
    Minha dúvida é:
    Se a interpretação de Moisés sobre o que ocorreu no eden difere da interpretação de Cristo na parábola do filho pródigo. Quero entender esse paralelo entre a repreensão de Cristo aos discípulo e a destruição das duas cidades do Gênesis. A compreensão de Moisés sobre o que ocorreu nas duas cidades teria também outra interpretação?

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *